| Das
representações de Inanna/Ishtar, a deusa do amor e da guerra entre
povos da chamada Mesopotâmia, às figurações de sexo explicito nas
fachadas e colunas de templos hindus da Índia; da nudez da Afrodite de
Cnido esculpida por Praxíteles ao êxtase/gozo da Santa Tereza de G. L.
Bernini; do falo ereto do Legba dos Fon da África Ocidental aos seios
expostos de diversas Pombagiras das umbandas brasileiras: imagens que
conectam o erótico e o sagrado foram e são muito frequentes e
difundidas, indicando que essas duas instâncias tem mais em comum do
que deixam entrever as interpretações redutoras das tradições
religiosas mundo afora. .. É
certo que, especialmente no Ocidente, o questionamento do pensamento
religioso que se segue ao dito "Século das Luzes" marcou o início de um
processo de relativa emancipação intelectual que perdura até hoje.
Muita@s artistas, se não rejeitaram propriamente conceitos religiosos -
como a existência de Deus ou do sagrado -, se sentiram livres para
redefinir esses conceitos, como na famosa tela de G. Courbet, A Origem
do Mundo (L'Origine du Monde, 1866). Mais recentemente, esse processo
se intensificou e o curto-circuito entre erótico e sagrado foi retomado
em uma chave irônica e/ou crítica. A contemporaneidade, em especial, é
um momento no qual o erótico é muitas vezes utilizado como uma
via de protesto e contestação de preceitos religiosos que não mais
parecem condizer com a realidade social, como exemplifica parte da
polêmica obra de Márcia X. . A
presente sessão temática do CBHA se propõe como um espaço dedicado às
diversificadas relações entre o erótico e o sagrado mediadas pelas
artes visuais. Para tanto, a sessão é aberta para todos os possíveis
objetos e abordagens teóricas. A ideia é criar um amplo campo de debate
transhistórico e transnacional, que permita aos participantes
construírem uma visão panorâmica de nosso tema. Além de pouco
usual na historiografia de arte brasileira, cremos que tal debate é
particularmente relevante no contexto contemporâneo, onde grassam a
intolerância religiosa e novas formas de fascismo em diversas partes do
globo. Se somos todos culturalmente programados em termos de
sexualidade e religião, o caminho para a tolerância é reconhecer que
nossos valores não são universais, mas sim subjetivos e pessoais.
Cremos que o estudo das imagens aqui proposto pode ajudar a
libertar-nos da tirania de nossos próprios valores e nos conscientizar
de quão contingentes e vinculados ao tempo, geografia e cultura eles
realmente são. |